O Supremo Tribunal Federal reconheceu, por unanimidade, a legitimidade do Ministério Público para ajuizar ação civil pública para obrigar o Estado a fornecer medicamentos a portadores de doenças consideradas graves e que não têm condições de pagar pelos remédios. Os ministros acolheram os argumentos da Procuradoria-Geral da República (PGR).
A decisão foi tomada no julgamento de recurso extraordinário apresentado pelo Ministério Público de Minas Gerais. A discussão se deu em cima do acórdão do TJ-MG entendendo que “não se inserindo no âmbito objetivo da ação civil pública o fornecimento de medicamentos a pessoas determinadas, deve ser indeferida a petição inicial por ilegitimidade ativa do Ministério Público”. Na ação, uma mulher com hipotireoidismo severo pedia a interferência da Justiça a fim de obter o medicamento.
Com o reconhecimento da matéria como tendo repercussão geral, o entendimento deverá ser aplicado aos processos sobrestados nas demais instâncias (existem, no Poder Judiciário, 1.897 processos sobrestados que aguardavam decisão do STF nesta matéria).
O relator, ministro Marco Aurélio, votou pela legitimidade do MP e disse que o pedido protocolado pelo órgão em primeira instância foi abrangente, e não para apenas uma pessoa. “Na ocasião, o Ministério Público tinha legitimidade para apresentá-lo. A partir disso, vemos a singularidade que respalda a atuação do MP. A inicial não trata só da situação referida da paciente específica, mas também a portadores de doenças consideradas graves. A ação não se mostrou individual em termos de benefícios, e sim de uma forma coletiva.” Já para o ministro Alexandre de Moraes, “a Constituição é clara ao falar que incumbe também ao MP a defesa dos direitos individuais indisponíveis”.
O ministro Gilmar Mendes, por sua vez, salientou que o Judiciário terá de fazer uma avaliação rigorosa de tais ações para que não aumente a judicialização da saúde: “Se houver ação de todo medicamento, a toda hora, vai ficar complicado. O volume de ações judiciais é crescente e tem causado desequilíbrio com valores altos”. Sobre o tema, o ministro Celso de Mello considerou que “entre proteger a inviolabilidade do direito à vida e à saúde e ter em mente os prejuízos financeiros do Estado, prevalece sempre o respeito indeclinável à vida e à saúde.”
A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, se manifestou favorável a que o MP continue ajuizando ações civis públicas para tratar de situações como esta. Segundo ela, a judicialização da saúde não é desejável, mas as políticas públicas de saúde falham ou não estão desenhadas de modo a atender adequadamente à demanda da sociedade. Na sua avaliação, se isso for corrigido para que não faltem medicamentos e serviços e para que o acesso seja garantido a todos, “a judicialização certamente será reduzida a um grau mínimo (…) A saúde deve ser prestada como um serviço de relevância pública. O MP tem a função de zelar pelo respeito dos poderes públicos e promovendo as garantias necessárias. O MP tem legitimidade para ajuizar ação civil pública”, concluiu a procuradora-geral.
Processo relacionado: RE 605533
