Os médicos Ibsen Suetônio Trindade e Andrés Gustavo Sánchez Esteva, investigados pela operação Marcapasso da Polícia Federal, vão continuar presos na Casa de Prisão Provisória de Palmas. A decisão foi tomada pela Justiça Federal após as audiências de custódia que começaram na quarta-feira, dia 8. Segundo a Justiça, eles são os supostos chefes do esquema de corrupção envolvendo fraudes em licitações.
A defesa havia alegado que eles não podiam ficar presos porque são os únicos especialistas em cateterismo. No entanto, o juiz afirmou que eles podem justamente ter se aproveitado desse fato para causar danos ao Estado.
As investigações da Polícia Federal apontam que pacientes supostamente foram submetidos a diversas cirurgias cardiológicas sem necessidade. O objetivo seria a utilização de órteses, próteses e materiais especiais adquiridos de forma fraudulenta e com superfaturamento.
Segundo a investigação, os próprios médicos passavam para a empresa fornecedora uma planilha com a quantidade de cirurgias realizadas, materiais utilizados e o valor mensal a ser recebido como propina. “Mensalmente, pagava em média o valor de R$ 80, R$ 90 e até R$ 100 mil para três cardiologistas”, diz trecho da delação dos empresários Antônio Bringel e Cristiano Maciel à Polícia Federal.
Ambos os empresários são proprietários da Cardiomed, empresa que disponibilizava os materiais para procedimentos médicos de urgência realizados nas dependências da Intervcenter, tanto para pacientes do SUS, quanto para pacientes do Plansaúde.
Ainda segundo as investigações, o valor dos materiais era superfaturado e junto com a nota fiscal era emitido um boleto para pagamento com “desconto”. Esse desconto era “exata e precisamente, o valor da propina que era repassada para a Intervcenter, para que fossem repartidas entre os sócios deste centro médico”, segue a delação.
Público e Privado – Os investigados que ocuparam cargos públicos também são suspeitos de receber propina para direcionar as licitações e compras dos materiais, além de utilizar equipamentos da rede pública em suas próprias clínicas e hospitais particulares. Entre os investigados está José Edimar Brito Miranda, pai do governador Marcelo Miranda (PMDB). Ele teria usado influência para liberar o pagamento de R$ 1,6 milhões para a empresa Cardiomed em 2015.
A soma do dinheiro que teriam recebido indevidamente é de R$ 4,5 milhões. Diante disso, a Justiça Federal determinou o bloqueio de mais de R$ 7,2 milhões em bens dos suspeitos.
Retomando o caso – A investigação começou quando os sócios da empresa Cardiomed foram presos em flagrante por terem fornecido à Secretaria Estadual de Saúde produtos destinados a fins terapêuticos ou medicinais que estavam com prazos de validade de esterilização vencidos. De acordo com a PF, depois das prisões foi descoberto um esquema de corrupção destinado a fraudar licitações do Estado do Tocantins, por meio do direcionamento de licitações.
O esquema foi verificado tanto em licitações do SUS, feitas pela Secretaria Estadual da Saúde, quanto nos pagamentos realizados pelo PlanSaúde, que atende o servidor público estadual. No caso do SUS, a PF diz que o estado usava o dinheiro público para comprar os produtos a um preço elevado. Neste caso, foi verificado um superfaturamento de cerca de 30%.
Em relação ao PlanSaúde, o superfaturamento pode ter sido maior, cerca de 60%. Esse valor superfaturado era dividido entre médicos e empresas, conforme a PF.
Recorrência – Não é a primeira vez que o tema é destaque no Brasil em 2017. No meio do ano, veio à tona a informação de que a empresa norte-americana assumiu ter pago propinas a médicos do SUS para facilitar a venda de produtos a hospitais públicos brasileiros.
A informação consta de investigação feita pelo governo americano em que a multinacional Zimmer Biomet Holdings Inc., que atua em mais de cem países, é acusada de violar legislação que proíbe práticas de corrupção no exterior. O ministro da Saúde, Ricardo Barros, chegou a ser informado da confissão, mas nenhuma providência foi tomada.
Judicialização – Outra fraude recente na saúde envolve ações judiciais para conseguir medicamentos de alto custo, a mando da indústria farmacêutica. Em 2015, a Corregedoria Geral da Administração e a Polícia Civil desmontaram um esquema que causou prejuízo estimado em R$ 40 milhões ao governo paulista.
A lopidamida, remédio para tratar hipercolesterolemia homozigótica (um tipo de colesterol raro e grave), estava sendo receitado por médicos a pacientes que não possuíam a doença e requerida via judicial. Cada comprimido custa em torno de US$ 1.000.
“A gente começou a ver coisas que não faziam sentido, como, em um determinado local, um número de pacientes com essa doença muito acima do máximo esperado pela literatura para uma doença rara”, disse o secretário estadual da Saúde de SP, David Uip, em julho deste ano. Segundo ele, as investigações mostraram que, via de regra, o paciente foi enganado por médicos e advogados, a serviço de farmacêuticas.
